ARTE RODRIGO VIZZOTTO
Na estrada, eu vi um boi pastando. Depois, atravessei um imenso campo vazio. Fiquei apaixonado. Resolvi me especializar em assuntos do agronegócio. Larguei tudo para me dedicar a esse novo amor. Passo meus dias analisando dados do IBGE. A verdade é que o IBGE me fascina. Li tudo o que encontrei a respeito da polêmica entre os ministros Guilherme Cassel e Reinhold Stephanes sobre a questão dos índices de produtividade. Perdi o último capítulo da novela por causa dessa nova obsessão. Coleciono frases, números, citações e deliciosos paradoxos. Que vida trepidante!
Li, por exemplo, que a agricultura familiar produz 30% da produção nacional em apenas 20% das terras. Uma declaração do ministro Guilherme Cassel me deixou tonto: "A agricultura familiar hoje responde por 70% daquilo que se consome no dia a dia". Os dados são do IBGE. Sempre o IBGE. Eu gosto mais do IBGE que da Gisele Bündchen. Fiquei ruminando: para que serve a produção do agronegócio patronal se é coisa que não se consome no dia a dia? O mundo do agronegócio é misterioso. Parece um romance policial. Os patrões devem R$ 130 bilhões para o Estado. Rolam a dívida. E ainda dizem que a dívida não é dívida. Alegam que a dívida foi inflacionada no governo Collor. Mas já houve renegociação em 2008. Só que os devedores, que tomam dinheiro emprestado a juros camaradas, ainda não estão contentes. Querem mais.
Quer dizer, querem pagar menos. Eu sou burro. Pensei que esse pessoal era contra ruptura de contratos. São liberais comunistas. O deputado Luís Carlos Heinze (PP) diz que "na hora de vender, o mercado dita o preço", mas o preço é mais baixo do que o custo de produção. Para ele, essa é a causa da dívida. Defende, então, subsídios governamentais. Ou seja, uma bolsa-fazendeiro. O governo já pratica uma política de preço mínimo que permite, literalmente, salvar a lavoura. Quer dizer, parte dela. O preço mínimo serve para tirar os produtores do barro quando o preço de mercado despenca por excesso de produção. Pelo que entendi, os liberais comunistas do agronegócio querem que o preço mínimo seja máximo.
Em outras palavras, querem produzir sem risco, sem perder seus latifúndios e à sombra do Estado generoso feito uma boa vaca leiteira. Se o preço de mercado é bom, eles vendem e ficam felizes. Se é ruim, o Estado deveria compensá-los com algo, digamos, como o preço de mercado. O problema é que li nos dados do IBGE (sempre o IBGE) que em alguns casos a agricultura familiar, em propriedades que encolheram de 78 para 63 hectares, chega a ser responsável por 60% da produção. Aqui: 89% do leite; 74% do milho; 58% do soja; 74% das aves; 71% dos suínos; 38% dos bovinos de corte; 97% do fumo. Ah, o fumo faz mal.
A agricultura familiar reúne gente no campo. Atrapalha a placidez do boi. Estou atordoado: "Os censos agropecuários indicam também que, apesar de disporem de uma área três vezes menor do que a detida pelo segmento patronal, os estabelecimentos familiares empregam 60% da mão de obra rural, participam com 27% da produção e conseguem apenas 10% dos financiamentos". É dado velho. Vou continuar estudando. Em nome do boi. É paixão.
Li, por exemplo, que a agricultura familiar produz 30% da produção nacional em apenas 20% das terras. Uma declaração do ministro Guilherme Cassel me deixou tonto: "A agricultura familiar hoje responde por 70% daquilo que se consome no dia a dia". Os dados são do IBGE. Sempre o IBGE. Eu gosto mais do IBGE que da Gisele Bündchen. Fiquei ruminando: para que serve a produção do agronegócio patronal se é coisa que não se consome no dia a dia? O mundo do agronegócio é misterioso. Parece um romance policial. Os patrões devem R$ 130 bilhões para o Estado. Rolam a dívida. E ainda dizem que a dívida não é dívida. Alegam que a dívida foi inflacionada no governo Collor. Mas já houve renegociação em 2008. Só que os devedores, que tomam dinheiro emprestado a juros camaradas, ainda não estão contentes. Querem mais.
Quer dizer, querem pagar menos. Eu sou burro. Pensei que esse pessoal era contra ruptura de contratos. São liberais comunistas. O deputado Luís Carlos Heinze (PP) diz que "na hora de vender, o mercado dita o preço", mas o preço é mais baixo do que o custo de produção. Para ele, essa é a causa da dívida. Defende, então, subsídios governamentais. Ou seja, uma bolsa-fazendeiro. O governo já pratica uma política de preço mínimo que permite, literalmente, salvar a lavoura. Quer dizer, parte dela. O preço mínimo serve para tirar os produtores do barro quando o preço de mercado despenca por excesso de produção. Pelo que entendi, os liberais comunistas do agronegócio querem que o preço mínimo seja máximo.
Em outras palavras, querem produzir sem risco, sem perder seus latifúndios e à sombra do Estado generoso feito uma boa vaca leiteira. Se o preço de mercado é bom, eles vendem e ficam felizes. Se é ruim, o Estado deveria compensá-los com algo, digamos, como o preço de mercado. O problema é que li nos dados do IBGE (sempre o IBGE) que em alguns casos a agricultura familiar, em propriedades que encolheram de 78 para 63 hectares, chega a ser responsável por 60% da produção. Aqui: 89% do leite; 74% do milho; 58% do soja; 74% das aves; 71% dos suínos; 38% dos bovinos de corte; 97% do fumo. Ah, o fumo faz mal.
A agricultura familiar reúne gente no campo. Atrapalha a placidez do boi. Estou atordoado: "Os censos agropecuários indicam também que, apesar de disporem de uma área três vezes menor do que a detida pelo segmento patronal, os estabelecimentos familiares empregam 60% da mão de obra rural, participam com 27% da produção e conseguem apenas 10% dos financiamentos". É dado velho. Vou continuar estudando. Em nome do boi. É paixão.
juremir@correiodopovo.com.br
Fonte: Correio do Povo, publicado em 12 de setembro de 2009.
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