quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Dica de leitura

Silenciadores Oficiais

Juremir Machado (Correio do Povo - 09/08/09)

O ditador Getúlio Vargas mandou o Estadão se calar. Os milicos ditadores de 1964 mandaram o Estadão se calar. O desembargador Dácio Vieira, amigo de José Sarney, mandou o Estadão se calar. Todo mundo manda o Estadão se calar. Ponto para o Estadão. Jornal de respeito existe para desrespeitar. Vieira esqueceu de mandar os senadores Fernando Collor, Tasso Jereissati e Renan Calheiros se calarem. Aí eles falaram à vontade. Collor mandou o colega Pedro Simon engolir. Tasso chamou Calheiros de 'coronel cangaceiro' e de 'dedo sujo'. Calheiros respondeu com a mesma elegância rotulando Tasso de 'coronel de m...' Um espetáculo edificante. A governadora Yeda Crusius adoraria ter calado Lair Ferst, Luciana Genro, Pedro Ruas e, principalmente, o Ministério Público Federal. Os políticos acham que tem gente falando demais.

Só Marcelo Cavalcante, o ex-aliado do governo gaúcho, morto num lago, em Brasília, está calado para sempre. Uma pena. A viúva dele fala. O irmão dele fala. Todos têm algo para dizer. Mas a sociedade ainda não sabe exatamente o que eles contam. Há um processo em curso em Santa Maria. A juíza Simone Barbisan não tem pressa em falar. Mas todos esperam pelo que ela vai dizer. O sociólogo francês Michel Maffesoli lembra que 'na corte dos imperadores bizantinos existiam os silenciadores oficiais'. Lembra mais: 'Eles tinham por função calar os perturbadores da ordem a fim de fazer reinar o pensamento único estabelecido. Traduzindo para termos contemporâneos, trata-se de uma conspiração do silêncio'. Aí está. Faz sentido. Estamos vivendo tempos bizantinos. O conservador Estadão perturba a ordem. Assim como Luciana Genro e Pedro Ruas. Dácio Vieira é um silenciador oficial. Yeda Crusius gostaria de ter o seu.

Há, ressalta Maffesoli, uma diferença entre opinião pública e opinião publicada. Os atos secretos do Senado não eram publicados para evitar a opinião pública. Muitas vezes, a opinião publicada pela mídia sufoca a opinião pública. No Brasil, contudo, os silenciadores oficiais querem liquidar a opinião pública e a opinião publicada. A tática mais comum dos silenciadores oficiais é paranoica: toda opinião publicada teria por objetivo conspirar contra o pensamento único do poder. Não importaria a natureza dos fatos, mas as intenções dos denunciantes e a origem das informações. Matou? Roubou? Desviou dinheiro público? Pouco importa. Relevante seria: quem deixou vazar? Com que objetivo? Em benefício de quem? Se o MPF silencia, está armando. Se dá coletiva e divulga parte das suas investigações, armou um circo.

É pam, pam, detran mesmo! A mais sofisticada artimanha dos silenciadores oficiais no Brasil é o segredo de justiça para processos envolvendo agentes públicos. Os silenciadores oficiais detestam que a opinião publicada fale em nepotismo, privilégios e outros jeitinhos que os poderosos usam para viver bem. Os silenciadores oficiais sonham com o dia em que toda opinião publicada fará a opinião pública desistir de fazer perguntas incômodas. O negócio é cortar línguas.



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